Resumos Revista Crítica 106 (2015)

Maria Paula Meneses
Xiconhoca, o inimigo: Narrativas de violncia sobre a construo da nao em Moambique

Este artigo analisa de forma ampla a transio política e as formas como a Frelimo tem lidado com a construo do projeto nacional, a partir de uma abordagem multidisciplinar e multissituada. O artigo discute a tentativa da criao do ‘homem novo’ no Moambique independente, avaliando a continuidade da presena da figura do inimigo interno, representado pelo Xiconhoca. Analisase, finalmente, o tema das reunies de busca de verdade e de reconciliao realizadas em 1975 e 1982 para redimir os considerados traidores ou atores antissociais –, discutindo em maior detalhe o contexto político-ideológico em que estas reunies aconteceram, assim como as suas implicaes no contexto da construo da cidadania e da história oficial de Moambique. Esta análise procura contribuir para repensar a violncia comunitária e estatal em Moambique e o papel de encontros de busca da verdade e de reconciliao nos processos de descolonizao política.

Benedito Machava
Galo amanheceu em Loureno Marques: O 7 de Setembro e o verso da descolonizao de Moambique

Este artigo analisa e descreve a emergncia de um grupo de resistncia africana durante a insurreio colona do 7 de Setembro de 1974 em Loureno Marques. O artigo examina a trajectória das elites africanas urbanas que lideraram o grupo de resistncia (conhecido como grupo Galo), e o desenvolvimento de um imaginário político marcadamente moderado, fruto das circunstâncias específicas do meio urbano onde sempre operaram. O seu papel foi determinante na proteco das populaes africanas contra o terrorismo dos insurrectos, bem como na recuperao do Rádio Clube de Moambique, evitando deste modo o escalar da violncia em Loureno Marques.

Fabrice Schurmans
Entre história e fico: O fracasso do homem de exceo. Une saison au Congo (Aimé Césaire) e Lumumba (Raoul Peck)

Este artigo analisa o modo como a tragédia de Aimé Césaire e o filme de Raoul Peck contribuem para a produo do discurso histórico relativo ao desaparecimento de Patrice Lumumba. Na primeira parte, abordo a ligao entre fico e história à luz do debate contemporâneo relativo à capacidade de o romance fazer e dizer a história, assim como ao que a história retira da fico. Na segunda parte, o texto incide sobre os contextos respetivos de ambas as obras, o que permitirá afinar a análise da pea e do filme. Por fim, na terceira parte, evidenciarei a maneira como Césaire e Peck representam a figura de Lumumba e reavaliam o passado colonial belga.

Bruno Sena Martins
Violncia colonial e testemunho: Para uma memória pós-abissal

O silenciamento da Guerra Colonial portuguesa / Guerras de Libertao (1961-1974) constitui um dos elementos mais estruturantes da reconstruo democrática e pós-imperial da sociedade portuguesa. Partindo de uma extensa recolha de histórias de vida de “deficientes das Foras Armadas”, o presente texto procura analisar as lutas pelo sentido trazidas pelas suas narrativas. Por um lado, procuramos perceber os termos de um confronto entre uma memória da violncia, corporalmente inscrita, e a denegao da violncia colonial no senso comum do Portugal democrático. Por outro, procuramos compreender de que modo a noo de uma guerra evitável e injusta, crescentemente sedimentada após o seu ocaso, cria um paradoxo para aqueles que, tendo sido parte de uma fora agressora, se configuram como vítimas.

Ungulani Ba Ka Khosa
Memórias perdidas, identidades sem cidadania

Este texto procura contribuir para o debate sobre as políticas identitárias no Moambique contemporâneo. Contrapondo, através de vários exemplos, a diversidade identitária do tecido social do país à altivez ignorante das estruturas de poder nele presentes, o texto procura problematizar, em vários momentos históricos, a fratura cognitiva entre o projeto político nacional, conceptualizado a partir das elites que controlam o Estado, e o plurilinguismo e a polifonia que constroem o tecido social real. A partir desta dicotomia o texto explora o discurso sobre a nao a várias vozes, problematizando os sentidos das lies da história de Moambique e os múltiplos silenciamentos que a narrativa histórica dominante vem realizando.

Teresa Cruz e Silva
Memória, história e narrativa: Os desafios da escrita biográfica no contexto da luta nacionalista em Moambique

Tomando como ponto de partida a inter-relao entre História, memória e narrativa, com este texto trazemos para discusso questes e interrogaes de carácter metodológico sobre o uso da narrativa biográfica como possibilidade de História. As nossas reflexes so realizadas a partir de várias leituras, feitas a posteriori, sobre os percursos de vida de Zedequias Manganhela e Eduardo Mondlane. Procuramos, assim, situar a configurao e reconfigurao dos discursos no contexto da “recuperao” de uma história nacional, que também mergulha no seio da construo de figuras de heróis nacionais. Tudo isto se situa ainda, quer no quadro de uma história oficial de Moambique, quer no quadro da própria história institucional da Igreja Presbiteriana de Moambique/Misso Suía à qual os dois protagonistas se encontravam intrinsecamente ligados, desafiando-nos a enfrentar as armadilhas da escrita biográfica.

Joo Paulo Borges Coelho
Abrir a fábula: Questes da política do passado em Moambique

Este texto discute o uso do passado na actual vida política em Moambique. Em particular, detémse na narrativa fundadora da nao moambicana (formulada como história de conteúdo moral, ou fábula), questionando aspectos como o da sua relao com outras memórias e a sua natureza oral. Desta última, resulta, por um lado, uma capacidade de adaptao às alteraes circunstanciais do presente, e por outro um grande poder dos detentores da narrativa – as testemunhas. Discute também as relaes necessariamente de tenso entre a memória política e a historiografia. No fundo, perguntase em que medida esta narrativa no se constitui como instrumento poderoso de diferenciao social e privilégio no actual quadro de luta pela democracia.

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Published 3 August 2015
Original in Portuguese

Contributed by Revista Critica de Ciencias Sociais © Revista Critica de Ciencias Sociais Eurozine

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