No lado negro da história

Uma entrevista com Carlo Ginzburg

O historiador italiano Carlo Ginzburg fala sobre suas publicações e discute seu método histórico que inaugurou a micro-história. Ginzburg descarta o relativismo prevalecente acerca da verdade histórica como uma preguiça moral, intelectual e política e argumenta contra igualar a história com a “memória coletiva da humanidade”. Ao invés disso, para ele, a história deve servir como um senso de justiça histórica, sendo o passado reconhecido e a verdade comprovada – por mais seletiva que seja nossa memória.

Soa como uma novela barata: Na primavera de 1321, na Semana da Páscoa, um rumor circula no sul da França de que uma conspiração para matar todos os cristãos está em andamento e que todos os poços estão contaminados. O rumor logo se espalha por todo o país e, com tempo, atravessa suas fronteiras e chega às atuais Suíça e Espanha. Em algumas das crônicas que chegaram até nós, diz-se que a conspiração é trabalho de leprosos.

Em outros lugares, o envenenamento dos poços foi atribuído a judeus que trabalhavam junto aos leprosos. Noutros ainda, a culpa foi colocada sobre líderes muçulmanos de Granada ou Tunísia ou ainda no Sultão da Babilônia que teria pagado judeus e leprosos para matarem cristãos. Os rumores resultaram em massacres e perseguições por toda a França e, em pouco tempo, eles se comprovaram através de confissões e outras evidências. Longas e detalhadas explicações parecem mostrar como o veneno foi introduzido nos poços. Os cúmplices dos conspiradores foram denunciados e cartas e documentos contemporâneos aos acontecimentos falam da associação de judeus com sarracenos e de planos para colocar um governo de judeus, leprosos e muçulmanos para tomar a Europa logo após a calamidade.

Como conseqüência destes acontecimentos na primavera de 1321, por toda a França, os leprosos foram internados. O objetivo era acabar com a conexão entre eles e a sociedade em geral, bem como prevenir que tivessem filhos. Esta foi a primeira medida de isolamento em larga escala de que se tem registros na Europa e que legou o padrão para medidas similares por séculos. Para os judeus, os eventos de 1321 resultaram em aprisionamentos e mortes nas fogueiras, confiscos de propriedade, exclusões do mercado e de atividades comerciais e, em 1323, na publicação de um édito real que os expulsaria da França. Por volta de 1321, o rei havia oficialmente confirmado que as acusações aos judeus estavam bem fundamentadas e deveriam ser tomadas seriamente.

A crença num sabá de bruxos

Essa história abre o livro Storia Notturna: una decifrazone del Sabba (1989), do historiador Carlo Ginzburg. Ginzburg refaz o curso de eventos em 1321 em detalhes minuciosos, descrevendo como o rumor se espalhou, de vilarejo em vilarejo e de cidade em cidade e como as acusações se tornaram progressivamente substanciais. Segundo a opinião do autor, as teorias da conspiração que se evidenciam nestes meses constituem um dos principais pré-requisitos de um fenômeno que nos séculos seguintes estaria destinado a deixar uma marca duradoura na história européia: a crença num sabá de bruxos.

A interpretação de Ginzburg destes eventos nos dá uma idéia do que o fez um dos historiadores mais proeminentes de nossos dias: seu talento como contador de histórias, seu interesse em crenças populares e a relação destas com a autoridade e o poder, bem como seu dom de resgatar os pequenos detalhes capazes de desafiar nossas visões formadas sobre a história. Tudo isto, junto a uma habilidade de detectar o grande no pequeno, de combinar uma compreensão das forças abstratas na história com a análise de acasos aparentes e incidentes insignificantes.

A grande conspiração

Carlo Ginzburg: O que testemunhamos na primavera de 1321 é a idéia de uma grande conspiração; a noção de que inimigos externos podem se aliar a pessoas em meio a nós de modo a minar toda a estrutura social. Esta idéia teve um impacto devastador no período estudado. Em 1348, por exemplo, judeus foram massacrados por toda a França, após terem sido acusados de alastrar a Peste Negra. No início do século 15, este modelo de conspiração reapareceu embora com outra roupagem. Desta vez, foram os praticantes da Magia Negra os supostos suspeitos por trás de um ataque velado à Cristandade. Eles não estariam mais ligados aos muçulmanos, mas ao Demônio. Conspiração, então, tornou-se onipresente. Ela não podia ser ligada a um setor específico da população e não estava mais enraizada em conflitos humanos, mas, ao contrário, na luta absoluta entre Deus e o Diabo. Com isto, o esteio da existência de um Sabá de Bruxos estava firmemente posto; os efeitos daquela crença seriam sentidos por toda a Europa por mais de dois séculos.

Trygve Riiser Gunderson: Mesmo assim, você vê os eventos de 1321 como únicos?

CG: Os rumores se espalharam tão rápida e sistematicamente naquela primavera que não pode ter sido possível por acaso. Alguma autoridade central deve ter tomado a iniciativa de espalhar as acusações. Logo, a idéia de conspiração foi uma conspiração. Partindo das fontes disponíveis, é razoável concluir que foram pessoas no centro do poder na França que estiveram por trás de tudo. As acusações, é claro, podem ter sido originadas em nível local, mas sua disseminação foi encorajada e dirigida a partir de uma fonte central. Isto distingue o mal-estar de 1321 dos eventos de 1348 e daqueles por volta de 1400, que foram de natureza mais espontânea.

Nos anos anteriores a 1321, havia um forte desejo, em círculos políticos, de destruir a posição econômica dos judeus e de assumir o controle de consideráveis somas então resultantes de organizações de caridade instituídas para ajudar leprosos. Com tempo, ambos objetivos foram alcançados.

O aparecimento de uma campanha coordenada em longa escala pode ser explicado apenas pelo contemporâneo surgimento do Estado-nação. A conspiração aparece apenas como uma imagem distorcida do novo sistema político; um tipo de grotesca caricatura das novas funções do Estado-nação, mas com aquele resquício de verdade que é característico de todas as caricaturas.

Este retrato, no entanto, emerge somente quando os acontecimentos de 1321 são vistos como um todo e estudados cronologicamente – quando os vários incidentes são encaixados e analisados dia após dia, se não hora após hora. Apenas então as ligações entre eles se tornam claras. Eu estou convencido de que a cronologia, pura e simples, é uma das armas mais poderosas do historiador. Ela pode ser tratada com suspeita pela historiografia moderna, mas sua eficácia crítica é muito maior do que muitos percebem.

TRG: Quando você fala do medo medieval de conspiração, é difícil não se lembrar de certos aspectos dos sentimentos gerais depois dos eventos de 11 de setembro de 2001.

CG: Quando escrevi o livro, é claro, não estava pensando nisso, mas hoje a comparação é, de fato, chocante. É uma daquelas coisas que podem acontecer quando se trabalha como historiador aqueles repentinos flashes de contemporaneidade. Os dois últimos anos, pelo menos, claramente demonstraram que o medo de uma conspiração é, ainda hoje, uma força poderosa. Ele pertence àquelas idéias históricas centrais que nos ajudam a determinar nossa visão da realidade. Eu vejo isto como uma parte de meu desafio como historiador; prestar atenção a tais acreções históricas – disseminar a crença de que nossas próprias vidas estão separadas do passado. Na verdade, qualquer coisa que possa nos livrar da ilusão de autonomia histórica me agrada.

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“Eu sou um judeu que nasceu e cresceu em um país católico. Eu jamais tive uma educação religiosa. Minha identidade judia é, em grande medida, o resultado de perseguições”, escreve Carlo Ginzburg no prefácio de um de seus mais recentes livros. Ginzburg nasceu em Turim, em 1939. Seu pai, Leone Ginzburg, ensinou literatura russa na universidade até perder sua posição, em 1934, por se recusar a fazer o juramento de lealdade imposto pelo regime fascista. Ele morreu em 1944, em uma seção da prisão romana controlada pelos alemães. Carlo, daí em diante, foi criado por sua mãe, Natalia Ginzburg (1916-1991), uma das principais escritoras italianas do século 20.

Como historiador, Ginzburg tem sido rotulado como micro-historiador ou detetive. Em várias ocasiões, ele argumentou que o trabalho do historiador não pode ser diretamente comparado com o de outras buscas científicas, mas que pertence a um paradigma de leitura de signos, de interpretação de pistas, que trabalha mais como um caçador ou um detetive do que como um cientista. A referência à micro-história vem de sua associação a um grupo de historiadores os quais, nas décadas de 70 e 80, defendiam que mudanças históricas somente podem ser totalmente compreendidas quando analisadas em um nível micro, no qual as conseqüências de estruturas sociais maiores sempre se fazem sentir.

Ambas características são amplamente ilustradas no mais conhecido livro de Ginzburg, Il formaggio e i vermi (O queijo e os vermes), publicado em 1976, que conta a história de um moleiro do norte da Itália, queimado na fogueira em 1599. Ginzburg chegou aos documentos relatando o caso de Domenico Scandella – conhecido como Menocchio – nos arquivos da Inquisição relacionados à região de Friuli. Neste livro, ele apresenta o relato de um artista leigo que, no curso de sua vida no vilarejo montanhoso de Montereale, formou uma singular visão do mundo e que, sobretudo, mostrou notável coragem e autoconfiança frente aos inquisidores. O título do livro vem da convicção de Menocchio de que o mundo surgiu do caos, “como o queijo é feito de leite e como os vermes nele aparecem, como se fossem anjos”, como explicou o próprio Menocchio aos seus juizes. O queijo e os vermes é escrito como uma autobiografia intelectual do há muito esquecido herético: um remontar de sua história, uma explicação das correntes intelectuais que o influenciaram e, não menos, um estudo meticuloso dos livros que Menocchio afirmou ter lido e suas interpretações deles.

O livro tornou-se um sucesso internacional. Desde a publicação da tradução inglesa, em 1980, a história de Menocchio foi traduzida para o alemão, francês, espanhol, holandês, sueco, japonês, português, servo-croata, polonês, húngaro, grego e turco, nesta ordem. O livro revolucionou a carreira de Ginzburg e adicionou à história de vida do moleiro um novo e imprevisto capítulo, quase quatro séculos após sua morte.

As oportunidades da subjetividade

CG: Algumas pessoas apontaram que deve haver alguma conexão entre meu passado e identidade como judeu e meu interesse histórico por personagens como Menocchio. Elas estão provavelmente certas. Mas eu não considero isto um problema. Nós continuamos tentando “expor” os diferentes motivos subjetivos por trás do trabalho dos historiadores. Mas isto faz algum sentido? É óbvio que nossas próprias experiências governarão nossos interesses como pesquisadores. E não há razão pela qual tais elementos subjetivos devam impor limitações sobre o trabalho do historiador, ao invés de apresentar oportunidades. Em meu próprio caso, o fato de eu não estar consciente desta ligação foi crucial. Isto me permitiu focar minhas atenções sem ser constrangido pela consciência de minha própria conexão autobiográfica ao material.

TRG: Voltando a olhar O queijo e os vermes, o que você sente?

CG: É impressionante quanto tempo e energia eu investi na simples justificativa do projeto: escrever um livro sobre uma pessoa totalmente desconhecida que não poderia reivindicar qualquer significado histórico tradicional. Hoje, aquele projeto seria mais rapidamente aceito. Eu considero O queijo e os vermes primeiro como uma tentativa de expandir a relevância da noção de indivíduo na história – transferir o retrato da individualidade da “elite cultural” ao que geralmente nos referimos como “as massas”.

TRG: Como você considera este projeto hoje – a ambição de re-acordar os esquecidos indivíduos da história?

CG: Nós não podemos encarar isto de maneira muito ingênua. Os detalhes da vida de Menocchio são por nós conhecidos apenas através dos escritos dos homens que o processaram. Os registros do tribunal são tudo de que dispomos. Para ser justo, eles são notavelmente detalhados, mas isto se deve ao fato dos juizes estarem estarrecidos pelo que Menocchio tinha a dizer. Estranhamente, em documentos da Inquisição é apenas quando a comunicação falha que o verdadeiro diálogo emerge. As respostas de Menocchio confundiram os juizes. Ou eles estavam fascinados por elas – não é sempre fácil decidir. De qualquer forma, eles repentinamente começaram a fazer perguntas reais; perguntas que não mais pressupunham respostas padrão. Isto nos permite olhar uma realidade que, sob diferentes circunstâncias, não estaria disponível. É uma situação estranha para mim como historiador – compreender que as perguntas dos inquisidores eram as mesmas que as minhas; que nós dividimos o mesmo estado de estupefação, o mesmo tipo de relação para com o interlocutor.

Seria provavelmente certo afirmar que O queijo e os vermes teve alguma influência na história social moderna. Eu não estou completamente certo de que isto seja uma coisa boa. A história social das últimas décadas, por vezes, pareceu um desfile dos orgulhosos perdedores da história. Tenho dúvidas a este respeito. Por outro lado, os aspectos da história representados por alguém como Menocchio são obviamente importantes, mas nós temos pouca necessidade de criação de uma contra-cultura histórica que exiba uma galeria de heróis derrotados. Isto transformaria história em ideologia e isto jamais é uma coisa positiva. No todo, você poderia dizer que tenho uma relação ambivalente com O queijo e os vermes: ele é de longe o mais bem-sucedido entre meus livros, mas não tenho certeza de que seja o melhor.

TRG: No entanto, seu livro dota Menocchio de uma voz própria. Não é isto importante em si mesmo? É difícil não se chocar com o fato de que ele, que passou tanto tempo tentando ser ouvido, tenha finalmente conseguido uma audiência e ganho algum tipo de reconhecimento?

CG: Eu concordo que tenhamos uma obrigação para com os mortos. É nosso dever contar a verdade sobre eles. Talvez você pudesse dizer que Menocchio conseguiu posteridade graças a meu livro. Ele se tornou um herói local em Montereale, o vilarejo em que nasceu (um Centro Menocchio foi inaugurado) e muitos leitores, em vários países, se identificaram com ele por diferentes e, muitas vezes, imprevisíveis motivos. Apesar disto tudo, não tenho certeza de que Menocchio tenha sido “ouvido” agora. É um processo de difícil avaliação e, às vezes, me sinto como uma figura periférica nele. O livro foi publicado, foi um grande sucesso e foi então conquistado pelos leitores que o usaram para diferentes propósitos. Por mais estranho que pareça, eu estava completamente despreparado para isto. Foi particularmente irônico, pois o livro é precisamente um estudo do mesmo processo – as adoções do próprio Menocchio dos escritos de outros, o poder do leitor sobre o texto.

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Carlo Ginzburg publicou seu primeiro livro, I Benandanti, em 1966. Ele introduziu um assunto que se tornaria sua marca em grande parte de sua carreira como historiador: o elo entre os julgamentos de bruxos e as crenças populares. Mais uma vez, a história se passa em Friuli e, desta vez, também foi a perplexidade demonstrada pelos inquisidores o ponto de partida para a pesquisa de Ginzburg. Quando em 1575 dois homens estavam num interrogatório sob suspeita de práticas de bruxaria, os juizes foram banqueteados com histórias de andanças noturnas mágicas e ritos secretos que pareceram encaixar-se perfeitamente em sua crença no horrível Sabá dos Bruxos. Mas havia algo que não colava: os acusados negaram veementemente serem bruxos. Pelo contrário, eles afirmaram ser benandanti, “aqueles que fazem o bem” – bons cristãos que, à noite, lutavam por Cristo contra os abomináveis bruxos que perambulavam para destruir as plantações nos vilarejos.

Em seu livro, Ginzburg revisa uma série de julgamentos de benandanti acontecidos em Friuli nos séculos 16 e 17. Sua teoria é que os estranhos testemunhos oferecidos pelos “bons” bruxos nos legam uma visão de um culto popular da fertilidade que deve ter existido antes, mas em paralelo com, a era cristã – um culto que eventualmente reaparece em forma pervertida na crença da Igreja no Sabá dos Bruxos. Esta teoria não apenas se chocou com outras concepções de bruxaria, como também foi de encontro à visão comum da religião popular na Europa medieval e moderna. A teoria permaneceria na dianteira dos interesses de Carlo Ginzburg pelos próximos 30 anos e, em 1989, sua preocupação com ela resultaria na publicação de sua grande obra Storia Notturna. Ginzburg mesmo vê este trabalho como sua magnum opus.

CG: Tudo começou por acaso – como a maior parte das descobertas que fiz em minha carreira. Creio que em alguns momentos do processo de pesquisa o pesquisador deve permitir-se ser estúpido – para simplesmente viver em estado de não-compreensão. Isto o deixa aberto àqueles acasos dos quais descobertas importantes brotam. Eu havia de fato terminado meu primeiro livro quando encontrei uma referência a um homem na Livônia (atuais Estônia e Lituânia) que em 1692 fora acusado de ser um lobisomem. Ele havia dito aos juízes que durante algumas noites tinha o hábito de se transformar em lobo e lutar ao lado de Deus contra bruxos e demônios que estavam roubando as colheitas do povo. Suas declarações convergiram em surpreendente detalhe com aquelas dos benandanti. Eram estas semelhanças apenas coincidências? Ou poderiam tais casos estar enraizados em crenças comuns que estariam mais difundidas? Eu consegui reescrever parte dos I benandanti nos últimos minutos, mas eu sabia que teria de começar tudo do início.

Fontes distorcidas

TRG: Em Ecstasies, você estuda ritos e fertilidade – idéias religiosas de diferentes contextos – tanto históricos quanto geográficos – todas elas similares àquelas encontradas nos estudos dos benandanti e do lobisomem do Báltico. Você traça as ligações entre elas e isto o leva a descrever uma série de mitos, ritos e convicções, raízes que se estendem tão longe quanto a pré-história da humanidade e que se estendem por várias áreas do globo. Você não tem medo de que seja demais para dar conta?

CG: Ao escrever Ecstasie, me deparei com problemas metodológicos formidáveis. Deve-se ter em mente que as crenças em questão pertencem ao que pode ser chamado de lado negro da história. Nós conhecemos muito pouco sobre ele. Temos pouquíssimo material. E quando muito raramente algo aparece em fontes escritas está invariavelmente mediado, filtrado, através da visão de outras pessoas – de um compilador de lendas populares, um antropólogo ou um membro da Inquisição, por exemplo. O material original é, então, muito difícil de ser acessado. Mais ainda, estas crenças são, por sua própria natureza, fenômenos complexos e obscuros para os quais nenhuma explicação histórica simples e inequívoca pode existir. Mas isto não significa que aquelas crenças nunca existiram ou que sejam irrelevantes. Estamos lidando aqui com um aspecto da realidade histórica que é fundamentalmente diferente daqueles com os quais os historiadores estão acostumados a lidar. No entanto, é desnecessário dizer que isto não os torna obsoletos.

TRG: Você tem sido acusado de super-especulação em seu trabalho. Como você descreveria o método empregado em Ecstasies?

CG: Como historiadores, nós devemos adaptar nossos métodos às fontes disponíveis. Mesmo apenas algumas pistas podem carregar uma realidade histórica maior, contanto que as encaixemos corretamente. Neste caso, onde o material era tanto escasso quanto disperso, a comparação tornou-se um instrumento crucial. Tome os benandanti e os lobisomens livonianos. Para começar, não havia nada que ligasse ambos os casos, historicamente falando. Mas, quando os comparei, fiquei chocado com o número de coisas que tinham em comum. A comparação pode ressaltar similaridades onde, de outra forma, tenderíamos a focar a diferença e isto foi decisivo neste projeto.

Há, por exemplo, um capítulo no livro sobre manqueira. Os lobisomens na Livônia eram guiados por uma criança manca. Após algum tempo, fui atingido por um número de ritos e mitos nos quais as imperfeições são importantes. Se tomasse como ponto de partida uma aproximação histórica tradicional jamais me acharia pensando se havia alguma conexão histórica – como tento demonstrar em meu livro – entre o Calcanhar de Aquiles, o sapatinho perdido da Cinderela e a dança Yu chinesa, na qual o pé é carregado de modo a produzir um andar lépido e ruidoso. Mas quando nos tornamos cientes da similaridade (que é difícil ser negada, uma vez que nossa atenção está voltada para ela) nos achamos, de repente, diante de um problema histórico genuíno que precisa ser observado. É por isto que a comparação é uma fonte única para os historiadores: ela nos ajuda a colocar questões. Em meu caso, a rede de similaridades rituais e mitológicas que descobri enquanto envolvido na escrita de Ecstasies evoluiu até uma questão histórica maior; uma das mais significativas que poderia enfrentar e uma que me senti compelido a tentar responder, mesmo que isso significasse adotar métodos e aproximações que poderiam resultar em desprestígio entre historiadores “sérios”.

Experimentando dimensões

TRG: Não há uma contradição aqui – entre comparação e cronologia, por assim dizer? Ecstasies começa considerando os eventos da primavera de 1321. Você vai da descrição de alguns meses em um ano específico, em sua introdução, até querer falar, como conclusão, algo fundamental sobre a existência da humanidade como um todo. Como você reconcilia estes dois conceitos?

CG: Eu vejo Ecstasies primeiramente como um experimento com dimensões. A idéia de combinar o maior e o menor em um só livro me atraiu – micro e macro-história em um único tempo, poderia se dizer. Há, ainda, uma intenção polêmica perpassando o modo como o livro é estruturado: ele pode ser lido como uma crítica ao que se poderia chamar de “história intermediária” (middle history); o tipo de história que aceita sem crítica os níveis explicativos que nós consideramos “naturais” em um dado contexto – uma nação, uma época, um período de tempo, por exemplo. Eu quis demonstrar que o escopo do estudo nunca pode ser tomado como certo. A escala que empregamos sempre determina a quais respostas é possível chegar a cada caso. Seja em nível micro, seja em nível macro.

Logo, as duas dimensões que você mencionou devem ser vistas juntas: para começar, tomo como foco a origem da crença num Sabá de Bruxos em uma área específica e dentro de um período de tempo limitado, através da mediação de eventos históricos datáveis e concretos. Mas de onde vêm tais crenças? Como podemos explicar que as noções de passeios noturnos, ritos esotéricos em êxtase, cultos e por aí afora se ligam a idéias concretas de conspiração às quais somos capazes de encontrar explicações lúcidas? Para responder a esta pergunta temos de nos dirigir a outra dimensão. Qualquer acontecimento, não importa o quão insignificante ele possa parecer, pode ser compreendido apenas na estrutura de uma realidade histórica mais ampla.

TRG: Então, em princípio, qualquer incidente pode tornar-se objeto de interpretações de tão amplo alcance quanto aquelas que você conferiu ao Sabá dos Bruxos em Ecstasies?

CG: Em princípio, sim, poderia.

TRG: Não seria mais fácil afirmar então que tudo está conectado e parar por aí?

CG: Não é, de fato, verdade que tudo está conectado? Estou convencido que sim. Isto não é tão ridículo quanto você está tentando fazer parecer. No entanto, devemos formular esta idéia não como resposta. Como resposta ela é totalmente trivial, um completo beco sem saída. Se nós a transformamos em uma pergunta, por outro lado, torna-se apenas uma questão de desenvolvê-la.

[3]

Mesmo tendo sido a infância e a adolescência de Carlo Ginzburg coloridas pelas atividades políticas radicais de seus pais, ele mesmo jamais foi politicamente ativo. Entretanto, por volta da década do lançamento de Ecstasies, questões que em um amplo sentido podem ser chamadas de políticas ocuparam um lugar central em seus escritos. Isto fica evidente em seu livro Il judice e la storico (1991), sobre o julgamento de seu íntimo amigo, o escritor e ativista italiano Adriano Sofri que, em 1988, foi sentenciado a 22 anos de prisão pelo assassinato do Comissário de Polícia Luigi Calabresi. Em seu livro, Ginzburg apresenta uma descrição detalhada do caso Sofri e traz à tona questões fundamentais não apenas quanto às declarações das testemunhas, nas quais as acusações se basearam, mas também quanto aos trabalhos do sistema judiciário italiano em geral.

O livro é também uma contribuição ao recente debate sobre a natureza dos estudos históricos, refletindo sobre os respectivos papéis dos juízes e dos historiadores e suas relações com a verdade e com a história. A exploração da narrativa por Ginzburg e suas críticas à escrita histórica tradicional o tem levado a ser associado com a ala pós-moderna do debate historiográfico, algo contra o qual ele vem veementemente protestando. Em uma série de artigos, Ginzburg surgiu como um ardente defensor do conceito de verdade histórica e como um surpreendente e feroz crítico da teoria pós-moderna da história.

CG: Seguidamente me vejo catalogado ao lado de meus “inimigos”. Isto demonstra o quão simplista tem sido a discussão acerca da pós-modernidade na história. A escrita da história é claramente uma construção: nós ligamos pedaços do que nos chega às mãos através dos séculos de forma a criar um quadro convincente do passado. Mas aquele quadro é igualmente uma re-construção. É esta tensão intrínseca – a obstinada e seguidamente inexplicável interação destes dois princípios – que dá ao estudo da história sua característica especial. Em ambos lados do debate, no entanto, parece difícil manter estas duas idéias em mente ao mesmo tempo.

Em princípio, nós jamais deveríamos ter embarcado num debate acerca da verdade na história, para início de conversa. Ao invés, deveríamos ter tido um debate sobre as provas. Em que bases pode-se argumentar como historiador? O que significa dizer que algo está historicamente provado? Em que ponto podemos dizer que uma afirmação histórica está refutada? É marcante como pós-modernistas, parecendo um tanto a-críticos, adotaram a ingênua idéia positivista da inquestionável e objetiva fonte histórica, uma fonte que é capaz, de uma vez por todas, fincar-se como registro da verdade suprema. Os dias deste conceito há muito se foram. Mesmo assim, permanece o fato dele continuar no ponto crucial do debate. Algumas pessoas parecem pensar que se é possível demonstrar que não existe uma fonte totalmente objetiva de conhecimento histórico, então todo conhecimento histórico é impossível. É evidente que isto não faz sentido. O que precisamos é de uma noção mais sutil de prova histórica – uma noção de prova que, por exemplo, leve em consideração todos os problemas especiais que nos confrontam quando tentamos investigar questões que se localizam fora do domínio tradicional da ciência histórica. A noção positivista de prova foi fundada na história política, legal e militar do século 19. A história social e cultural, por exemplo, dependem de uma diferente autenticação das fontes e de diferentes tipos de provas.

Inúmeras explicações possíveis.

TRG: Mas a crítica pós-moderna nos ajudou a demonstrar que muito do que era desprezado na história é incerto – que muitas de nossas mais queridas “verdades” históricas são de fato construtos?

CG: Eu concordo totalmente com a base anti-autoritária da posição pós-moderna. Eu inclusive divido com ela o ceticismo, até certo ponto. Por exemplo, nós podemos facilmente aceitar que novas explicações de um dado fenômeno histórico são sempre possíveis, uma vez que todos enunciados científicos estão abertos à refutação (como Karl Popper apontou) e são, portanto, em certo sentido, provisórios. Todos enunciados históricos pertencem (como apontou Marc Bloch) ao campo da probabilidade, mesmo nas vezes em que as chances de serem refutados são muito próximas de zero. Nem Popper, nem Bloch eram, é claro, pós-modernos. Invocar suas autoridades para argumentar que todas explicações históricas são equivalentes seria absurdo. Refugiar-se no relativismo é um caminho fácil demais para encarar os desafios que nos confrontam – tanto no estudo da história como na sociedade como um todo. A posição relativista está fundamentalmente errada, em minha opinião – intelectualmente errada, politicamente errada e moralmente errada. Choca-me como um aspecto curioso da história intelectual moderna que palavras tais como “verdade” e “realidade” adquiriram um tipo de mácula reacionária, enquanto palavras como “sonho” e “desejo” sejam consideradas radicais. Em conseqüência, a posição cultural conservadora tornou-se a posição radical, ao mesmo tempo em que as categorias nas quais a tradição radical se baseava tem sido alijadas. Para a Esquerda, este tem sido um erro fatal. Escolher o desejo à realidade (incluindo a realidade desagradável) parece-me uma manobra sonhadora, auto-derrotista. Neste ponto, distancio-me bastante da cultura de 68 e de seus impactos de longo prazo.

Igualmente, vejo o debate que circunda o pós-modernismo em estudos históricos basicamente como enganador; ele tem sido um debate enganoso (sham debate) que ajuda a velar as verdadeiras dificuldades políticas e epistemológicas que se mostram atualmente à disciplina histórica.

TRG: Seria correto afirmar que um dos desafios que confrontam a história é sua relação com a literatura? Seguidamente você escreve sobre seu interesse na tradição moderna, mas a crítica do modernismo literário às representações tradicionais da realidade é freqüentemente mencionada como um dos principais exemplos da impossibilidade inerente nos projetos históricos tradicionais.

CG: Para mim, esta é uma outra contradição artificial. Ver a história e a literatura como dois campos totalmente díspares é tanto errôneo quanto a-histórico. Elas sempre existiram em diálogo, mais ou menos justapostas. O fato de que uma escrita histórica às vezes se desenrola até uma ficção e que, mais ainda, ela seguidamente baseia-se em modelos literários, não deveria nos surpreender. Uma aproximação mais desafiadora – tanto para a história quanto para a literatura – é partir do fato que ambas disciplinas dividem uma obrigação para com a verdade e ver como esta relação tem sido feita em épocas diferentes. Eu considero o modernismo literário, antes de mais nada, como uma tentativa de descobrir novas formas de verdade, incluindo o plano formal. Neste aspecto ele é totalmente relevante para mim como historiador.

Cada obra literária – seja um texto ficcional ou histórico – torna a realidade visível em sua própria maneira, transmite sua visão de realidade. Poderia ser dito que formas lingüísticas específicas são relacionadas a formas específicas de verdade. Há um tipo de compulsão formal a serviço aqui – toda forma literária nos força a descobrir algo e a ignorar algo mais. A narrativa tradicional, por exemplo, tem suas próprias limitações inatas; ela impõe um tipo de compulsão seqüencial: algo deve vir primeiro e algo mais tarde. Quando escrevi O queijo e os vermes, sonhei em escrever o livro em uma única página gigante para poder escapar desta camisa-de-força. Evidentemente, foi uma idéia ridícula. Mas a forma literária empregada pelo historiador será sempre um dos dois filtros centrais que separam a obra histórica da realidade que ela pretende relatar. O outro filtro são as fontes em si. Na realidade, ambos filtros implicam um número de fatores potencialmente distorcidos. Deste modo, a idéia de uma narrativa histórica simples é tão absurda quanto a idéia de uma prova histórica irrefutável.

Nosso conhecimento é fragmentário

TRG: Desde que você publicou seu primeiro ensaio, você manteve seu estilo altamente distinto de escrita e composição. Seus textos são estruturados numa série de parágrafos que levitam e curtos capítulos que dão à escrita um caráter ensaístico, deslocado, mesmo em um grande trabalho como Ecstasies. O que o induziu a adotar tal estilo?

CG: Eu me deparei com este estilo quando ainda jovem li um ensaio de Luigi Einaudi, um distinto economista e historiador da economia, que acabou se tornando presidente da Itália. Ele era pai de Giulio, o famoso editor. O ensaio era construído em uma série de parágrafos numerados – um modelo que me agradou visto meu fascínio por cinema e montagem. A montagem corresponde ao que considero ser o elemento construtivo em estudos históricos: ela deixa claro que nosso conhecimento é fragmentário e que ele deriva de um processo aberto. Sempre foi minha ambição que a incerteza do processo de pesquisa deveria aparecer no que eu escrevo – eu tento retratar minha própria hesitação, por assim dizer, para capacitar o leitor de fazer seu próprio julgamento. A escrita histórica deveria aspirar à democracia, ou seja, tornar possível a verificação dos enunciados de fora e que o leitor seja uma parte não apenas das conclusões alcançadas, mas também do processo que levou a elas.

TRG: Nos anos que se passaram desde a publicação de Ecstasies, você se reservou a ensaios e a coleções de ensaios. A exceção é seu livro sobre o caso contra Adriano Sofri. Poderia ser dito que este trabalho se diferencia claramente do restante de sua produção?

CG: Sim, você está certo. É diferente. Eu acho bastante difícil falar deste livro. Foi o primeiro livro que escrevi que se centra num evento concreto. Mais ainda, ele foi escrito com uma clara idéia em mente: meu objetivo era obter a soltura de Adriano Sofri e dos outros dois homens que com ele foram acusados do assassinato de Calabresi. A intenção do livro foi elaborar uma ação judicial. Isto, é claro, deixou sua marca na escrita. Mas minha ação não foi bem sucedida, o que me perturba. O livro não teve efeito, até onde sei. É verdade que ele atraiu atenção ao caso, mas ele não alcançou nada. Adriano Sofri continua na prisão. Então, neste sentido, ele permanece o menos eficaz de meus livros, mesmo sendo o mais publicamente pragmático e político dentre eles.

TRG: Isto significa que você o considera um fracasso? Você o escreveria de forma diferente se o escrevesse hoje?

CG: Não, eu tenho certeza de que o escreveria da mesma forma. Mas isto não abranda a questão.

TRG: Você diz que seus livros não têm sido políticos, no sentido tradicional. Mesmo assim, em alguns momentos de seu trabalho, você se refere a um tipo de projeto de libertação, apesar disto ser talvez mais utópico que político. No prefácio de O queijo e os vermes, você cita o filósofo alemão Walter Benjamim: “Nada do que aconteceu deve ser perdido para a história. Mas só à humanidade redimida o passado pertence inteiramente”1. Sob esta luz, o historiador tem algo relacionado a uma função religiosa – aquela de alguém lutar para lembrar o que foi esquecido e, ao fazê-lo redimir a humanidade. É assim mesmo?

CG: Eu escrevi aquele prefácio há muito tempo. Vamos apenas dizer que eu não usaria aquela citação hoje. Walter Benjamin a escreveu como um radical judeu durante a Segunda Guerra Mundial em circunstâncias nas quais, apesar de não existir um vestígio de esperança, ele deveria continuar esperançoso. Isto torna seu impacto ainda mais profundo. A citação se refere a uma idéia profundamente enraizada em nossa tradição – a idéia de que no fim tudo será redimido. Como um dos Patronos da Igreja escreve, no último dia até mesmo o Demônio será redimido. É um belo pensamento, mas acho difícil de acreditar nele. Tudo – vida, história, natureza – parece hoje demasiado vulnerável. De modo geral, acho difícil perseguir um significado na história. Eu nunca duvidei de que ser um historiador é significativo, mas eu duvido muito de que a história tenha um significado em si.

Nem a memória está livre de seus problemas. Considere tudo que “aconteceu”, como Benjamin escreve e quão pouco nós preservamos disso. Quase nada! E ainda: nós não temos qualquer garantia de que o que sabemos é o que foi realmente importante. Tome a nós mesmos como exemplo: nós sequer sabemos se o que nós lembramos vale a pena ser lembrado. E se o que nós de fato lembramos está correto. Considere todas as coisas importantes para nós que jamais refletimos, de que nós jamais estamos totalmente cientes. A magnitude do que é realmente importante para o mundo provavelmente jamais será pensada, jamais será lembrada.

História, julgamento e justiça

TRG: Mas você escreveu em algum lugar que nós perdemos um meio vital de nos relacionarmos com o passado quando abandonamos a idéia de que alguém enfrentará julgamento na história e, certo ou errado, será feita justiça. O que isto significa?

CG: Há algo de problemático com a ligação inequívoca de nosso conceito de história com a idéia de lembrança, de memória. Nós tendemos a falar da história como a memória coletiva da humanidade – mas a memória coletiva tem freqüentemente funcionado sobre princípios de esquecimento.

Na criação do nacionalismo moderno ou dos maiores movimentos ideológicos do século 20, a memória coletiva foi eficaz principalmente em virtude de tudo o que ela deixou de fora: a história foi transformada em uma sucessão de quantidades simbólicas e abstratas, todas remetidas ao nosso Passado Glorioso: revolução, guerra, luta de classes, Germânia, Marianne, o Soldado Desconhecido e por aí afora.

Até mesmo a memória pessoal é seletiva, por sua própria natureza: lembramo-nos apenas do que não nos esquecemos. A lembrança está, por assim dizer, entrelaçada com o esquecimento. É por isso que o historiador judeu Yosef Yerushalmi apontou que o oposto do “esquecimento” não é realmente a “lembrança”, mas a “justiça”. Foi o conceito de justiça histórica final que formou a raiz da antiga idéia de julgamento. Acho difícil pensar que ele não seja um modelo mais satisfatório para a genuína consciência histórica do que aquele que hoje empregamos.

Mas a idéia de julgamento não pode ser confundida com aquela de vingança. Isto é crucial. Meu pai morreu torturado em uma prisão em 1944 e ninguém da família o viu em seus últimos meses de vida. Muitos anos depois, eu li a autobiografia de Sandro Petrini que, como meu pai, foi um socialista ativo durante a guerra e que se tornaria presidente da Itália. Descobri que ele foi encarcerado na mesma prisão que meu pai e que o havia encontrado pouco antes dele morrer. Meu pai havia dito a Petrini: “Não importa o que aconteça, precisamos nos lembrar de não odiar os alemães”. Da história nunca deve ser feita uma fonte de culpa a ser carregada pela próxima geração.

Mesmo assim, o conceito de justiça histórica vincula sua própria maneira de ver a história a certo tipo de reconhecimento do passado. Para mim, é este reconhecimento final que está no coração do conceito de julgamento. É difícil expressar em termos precisos, mas isso me tocou quando vivi na Alemanha, o fato de poder ver uma grande diferença entre aqueles que tinham este tipo de consciência histórica e os que não o tinham. Neste plano, você pode dizer que eu, como historiador, estou participando de um projeto político ou ético. Nós não podemos mudar a história, mas nós podemos ajudar a manter nossa conexão com ela.

Segundo tradução de Maria Betânia Amoroso para a 10a reimpressão da edição brasileira (São Paulo: Companhia das Letras, 1998, p.34) [N. do trad.].

Published 20 July 2005
Original in Norwegian
Translated by Hugo Arend
First published by Samtiden 2/2003 (Norwegian version) and Revista Histórica 7/2003 (Portuguese version)

© Eurozine Samtiden

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